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No Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, reflitamos sobre Gênero, Raça e Classe, e o debate interseccional travado na UFMA semana passada

Como forma de registrar a passagem do dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, convidamos à reflexão (que estimula a práxis) sobre o importante debate realizado dia 20 último no Campus do Bacanga, promovido pela APRUMA através do Grupo de Trabalho de Política de Classe para as questões Etnicorraciais, de Gênero e Diversidade Sexual (GTPCEGDS). Na ocasião, a professora Francilene Cardoso e o professor Rosenverck Estrela Santos chamaram atenção para o fato de o combate radical a opressões como machismo, racismo e homofobia representar, também, o combate ao capitalismo, ambiente ideal de reprodução dessas opressões.

Barbárie

A professora Francilene Cardoso lembrou o que vem sendo denunciado como genocídio verificado nas periferias: “para negras e negros, a barbárie do capitalismo se expressa no cotidiano. Não temo como, no capitalismo, ser diferente: ele é anti-humano, é anti-natureza, daí as crises ambiental, social etc. Para esse sistema se manter, isso significa, para nós, negras e negros, mais genocídio”. Francilene registrou: “Da barbárie, ninguém escapa”

A professora marcou que as mulheres negras são triplamente oprimidas: “pelo capitalismo, pelo racismo e pelo machismo”. Assim, seria uma falácia acreditar na integração de negras e negros na sociedade de classes, e uma forma de mostrar isso é “enegrecendo o debate”, trazendo-o à tona, sem deixar de apontar para essas opressões e para o sistema que as reproduz.

A Interseccionalidade

Uma das questões apontadas por Francilene é que debater raça, gênero e classe, é complexo, mas é um debate que não pode ser hierarquizado, ou seja, uma questão não pode se sobrepor à outra, pois isso diminui tanto o próprio debate quanto a superação das opressões, sejam elas de ordem econômica, ou a racista, a homofóbica ou a machista.

Para o professor Rosenverck, um dos problemas é que somos levados a pensar compartimentalizadamente, e essa forma de pensar sobre esses problemas faz parte do projeto que precisa ser superado, pois é nele que se reproduzem as opressões.

Nesse sentido, ele apontou como a escravidão permitiu, por exemplo, a industrialização europeia. Ele procurou demonstrar como a questão do trabalho  e da exploração capitalista induzida pela industrialização do Velho Continente esteve interligada com o racismo, com a escravidão e com a ocupação do Continente Africano, com esses fatores favorecendo a acumulação de capital necessária àquela.

Sobre a necessidade de se discutir tais temas, Rosenverck apontou que essa é uma exigência enquanto perdurarem as opressões.  “A grande tarefa ao se identificar a violência do machismo, do racismo, da homofobia, é buscar sua superação”. Para ele, essas questões estão vinculadas à exploração dos seres humanos atingidos por essas violências – e é nesse ponto em que está a necessidade de se interseccionalizar a discussão, que não deve cessar enquanto o capitalismo estiver de pé, produzindo miséria e barbárie. Para o professor, a superação dessa condição é uma diretriz para a humanidade, para opressores e oprimidos, posto que tornará a todos mais humanos. Manter esse estado de coisas, não apenas desumaniza a todos, mas é uma demanda estrutural do próprio sistema capitalista – daí a necessidade de sua superação – que não se dará sem romper com essas opressões, que devem ser combatidas cotidianamente.

Os debatedores apontaram então o desafio de se pensar alternativas. “É tarefa nossa construir alternativas que sejam por fora dessa ordem que nos oprime, que nos desumaniza”, enfatizou Francilene.

Para os participantes, o debate não apenas acrescentou a essas discussões, como se mostrou necessário que outros mais sejam realizados. A sala lotada no Centro de Ciências Humanas da UFMA parecia reverberar as palavras de Preta Lu, que acompanhou a discussão: “Nós, negras, somos o próprio cimento disso tudo, sobre o qual tudo isso foi construído”, disse, apontando a necessidade de se realizar mais eventos como esse para que se pense como conseguirmos, enfim, a emancipação humana amarrada a essa estrutura.

O Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha

O dia 25 de julho marca o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha. A data teve origem durante o 1º Encontro de Mulheres Afro-Latino-Americanas e Afro-Caribenhas realizado em Santo Domingo, na República Dominicana, em 1992. Ao longo dos anos, vem se consolidando no calendário de luta do movimento negro e tem resgatado a resistência das mulheres negras, bem como cumprido o papel de denunciar as consequências da dupla opressão que sofrem, com o racismo e o machismo. Ainda no mês de julho, é comemorado, no dia 31, o Dia da Mulher Africana.

No Brasil, o dia também é em homenagem à Tereza de Benguela, líder quilombola que se tornou rainha, resistindo bravamente à escravidão por duas décadas. Esse ano, a data traz à tona a luta da mulher contra o feminicídio, as reformas que destroem os direitos do povo brasileiro, principalmente, das mulheres negras e por reparações à comunidade negra.

“Essa data é importante porque chama a reflexão para a situação de setores mais explorados e oprimidos da sociedade, que é a mulher negra Latino-Americana e Caribenha, e para os indicadores sociais, econômicos, políticos, que denunciam essa condição da mulher na sociedade brasileira”, disse Cláudia Durans, diretora de Dignidade humana da APRUMA, 2ª vice-presidenta do ANDES-SN e uma das coordenadoras do Grupo de Trabalho de Política de Classe para Questões Etnicorraciais, Gênero e Diversidade Sexual (GTPCEGDS) do Sindicato Nacional.

Segundo a coordenadora do GTPCEGDS, a data possibilita também resgatar a história da mulher negra no Brasil. “É um histórico de luta e resistência, como no período colonial, em que mulheres enfrentaram o escravismo, dirigindo insurreições, fazendo parte da direção dos quilombos, como é o caso da Tereza de Benguela. E esse resgate é importante, pois a mulher negra chefia famílias e garante o sustento familiar”, afirmou a docente.

Tereza de Benguela liderou o Quilombo de Quariterê após a morte de seu companheiro, José Piolho. Conforme documentos da época, o lugar abrigava mais de 100 pessoas, entre negros e indígenas. O quilombo, localizado no Vale do Guaporé (MT), resistiu da década de 1730 até o final do século XVIII. Tereza foi morta após ser capturada por soldados em 1770.

APRUMA, com informações do Andes-SN e da CSP-Conlutas

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